O que é WCM?
- Kauê Bukowitz Beluzzo
- 18 de mai.
- 6 min de leitura
A Evolução da Excelência Operacional na Indústria
Existem diversas metodologias de melhoria contínua de aplicação na indústria. Entre tantas, qual escolher? O que é o WCM e qual a diferença dela para as demais?
Mais do que um sistema de produção, o WCM é uma filosofia de gestão abrangente, que combina práticas de Lean Manufacturing, TPM (Total Productive Maintenance), Seis Sigma, Kaizen, entre outras ferramentas e métodos de melhoria contínua.
A sigla WCM significa World Class Manufacturing, e é uma metodologia de gestão industrial que busca excelência operacional por meio da eliminação sistemática de perdas, melhoria contínua e envolvimento total das pessoas. Seu objetivo principal é tornar uma organização verdadeiramente de classe mundial — ou seja, altamente competitiva em custo, qualidade, prazo e flexibilidade.
Por que o WCM foi criado? A origem e sua evolução histórica
A origem do WCM está profundamente ligada à evolução da manufatura enxuta e da manutenção produtiva total (TPM). Após a Segunda Guerra Mundial, o Japão, com recursos limitados, desenvolveu sistemas produtivos altamente eficientes, dos quais se destaca o TPM, com forte foco na confiabilidade e na eficiência dos equipamentos.
Contudo, nas décadas seguintes, percebeu-se que o TPM, apesar de muito eficaz na gestão da manutenção e do chão de fábrica, não abrangia plenamente áreas como logística, qualidade de fornecedores, ergonomia, meio ambiente e, principalmente, processos da cadeia de suprimentos.
Foi nesse contexto que o professor japonês Hajime Yamashina, da Universidade de Kyoto, criou o WCM na década de 90 na FIAT. Ele idealizou um sistema mais abrangente e integrador, que pudesse aplicar os princípios do lean e da melhoria contínua em toda a cadeia de valor, incluindo processos logísticos, administrativos e até comportamentais.
Yamashina estruturou o WCM com base em pilares técnicos e gerenciais, integrando diversas ferramentas já conhecidas da engenharia industrial e organizacional. Desde então, grandes empresas globais como Fiat, CNH Industrial, Whirlpool, Pirelli e muitas outras adotaram o WCM como modelo de gestão de excelência.

Como funciona o WCM?
O WCM funciona como uma plataforma de gestão baseada em pilares estruturados, auditorias rigorosas e projetos Kaizen, visando atacar perdas em todas as áreas da organização. A implementação é feita de forma disciplinada, com forte envolvimento da liderança e dos operadores.
Os Pilares do WCM
O WCM é estruturado em 10 pilares técnicos, cada um com funções e métricas específicas. Esses pilares focam diretamente na eliminação de perdas e aumento da eficiência:

Além dos pilares que trabalham com um vasto plano de gerenciamento e implantação, existem também os pilares que são fatores essenciais na implementação da metodologia:
Comprometimento da Direção
Clareza nas metas
Mapeamento de custos e perdas
Gestão da melhoria
Comprometimento das pessoas
Treinamento
Comunicação visual
Auditorias
Benchmarking
Planejamento e tempo
Estes garantem a sustentação e disciplina da cultura de melhoria contínua.
A lógica de implementação: o modelo dos 7 passos
Para cada pilar técnico, o WCM propõe uma jornada de sete passos, que orientam a maturidade e evolução dos processos. Esses passos envolvem desde a compreensão da situação atual até a padronização e disseminação das melhores práticas.
Por exemplo, no Pilar de Manutenção Autônoma, os 7 passos incluem: limpeza inicial, eliminação de fontes de sujeira, inspeções, padronização, entre outros.
Auditorias e pontuação
A metodologia adota um modelo de pontuação onde cada fábrica pode receber certificações (Bronze, Prata, Ouro, etc.), com base em auditorias periódicas. O sistema de auditoria é rigoroso e promovido por consultores externos (muitas vezes da própria rede global da empresa), promovendo benchmarking e alinhamento global.
Etapas para implementar o WCM
A implementação do WCM segue uma estrutura padronizada, mas pode variar em intensidade conforme o nível de maturidade da organização. De forma geral, os passos são:
Diagnóstico Inicial: mapeamento de perdas, gargalos e oportunidades.
Formação da equipe de pilares: times multidisciplinares para cada pilar técnico e gerencial.
Capacitação: treinamentos em conceitos como Kaizen, OEE, 5S, Ishikawa, A3, etc.
Priorização dos pilares iniciais: normalmente inicia-se com segurança, custo de perdas e manutenção autônoma.
Execução de projetos piloto (Kaizens): aplicação prática com metas claras e métricas.
Auditorias internas e externas: avaliações regulares e planos de ação.
Reconhecimento e certificações: estímulo por meio de selos (bronze, prata, ouro).
Mas o que são os pilares e quais os objetivos deles?
1. Segurança (Safety)
Objetivo: Eliminar acidentes e criar um ambiente de trabalho seguro e saudável.
Práticas comuns:
Análise de risco (ex: matriz de risco)
Investigação de acidentes e quase-acidentes
Implementação de dispositivos à prova de erro (poka-yoke)
Auditorias comportamentais de segurança
Resultados esperados: Zero acidentes e cultura de segurança fortalecida.
2. Desdobramento de Perdas (Cost Deployment)
Objetivo: Identificar, quantificar e priorizar as perdas que geram mais impacto financeiro.
Práticas comuns:
Mapeamento de perdas com base em categorias (paradas, retrabalhos, perdas de material, etc.)
Cálculo de impacto financeiro por tipo de perda
Priorização das ações com base no custo
Resultados esperados: Clareza sobre onde agir para gerar o maior retorno financeiro.
3. Melhoria Focada (Focused Improvement / Kaizen)
Objetivo: Eliminar perdas específicas com ações direcionadas e sistemáticas.
Práticas comuns:
Projetos Kaizen com equipes multifuncionais
Uso de ferramentas como A3, PDCA, 5 Porquês, Ishikawa
Aplicação dos 7 passos do pilar
Resultados esperados: Redução rápida e contínua de perdas críticas.
4. Manutenção Autônoma (Autonomous Maintenance)
Objetivo: Engajar os operadores na conservação básica dos equipamentos.
Práticas comuns:
Limpeza e inspeção diárias realizadas por operadores
Treinamento para identificar anomalias
Padronização visual
Resultados esperados: Equipamentos mais limpos, seguros e com menos quebras.
5. Manutenção Progressiva (Professional Maintenance)
Objetivo: Garantir a confiabilidade técnica dos ativos com manutenção planejada.
Práticas comuns:
Planos de manutenção preventiva e preditiva
Análise de falhas crônicas (RCFA, FMEA)
Gestão de indicadores como MTBF e MTTR
Resultados esperados: Redução de falhas técnicas e aumento de disponibilidade.
6. Controle da Qualidade (Quality Control)
Objetivo: Garantir a entrega do produto certo, na primeira vez.
Práticas comuns:
Eliminação de fontes de defeitos
Detecção precoce de anomalias
Controles à prova de erro
Análises de causa raiz de defeitos
Resultados esperados: Redução de retrabalho, devoluções e custos com qualidade.
7. Logística (Logistics and Customer Service)
Objetivo: Otimizar o fluxo de materiais internos e externos, alinhado à demanda do cliente.
Práticas comuns:
Abastecimento puxado (sistema puxado, kanban)
Redução de estoques intermediários
Layouts enxutos e rotas otimizadas
Resultados esperados: Entregas mais rápidas, menos desperdícios e maior flexibilidade.
8. Desenvolvimento de Pessoas (People Development)
Objetivo: Construir competências para sustentar o WCM em todos os níveis.
Práticas comuns:
Matriz de habilidades (skill matrix)
Trilhas de desenvolvimento por função
Multiplicadores internos
Resultados esperados: Colaboradores mais capacitados e engajados na melhoria.
9. Gestão de Produto (Early Equipment/Product Management)
Objetivo: Evitar perdas desde o desenvolvimento de novos produtos e processos.
Práticas comuns:
Introdução controlada de novos equipamentos e produtos
Aplicação de lições aprendidas (kaizens passados)
Projetos com foco em manutenibilidade, qualidade e ergonomia
Resultados esperados: Lançamentos mais eficientes e menos problemáticos.
10. Meio Ambiente (Environment)
Objetivo: Reduzir impactos ambientais e garantir conformidade legal.
Práticas comuns:
Monitoramento de consumo de recursos (água, energia)
Gestão de resíduos e efluentes
Planos de ação para emergências ambientais
Resultados esperados: Operação sustentável e menor risco ambiental.
Por que adotar o WCM?
Implementar o WCM não é apenas seguir uma metodologia — é promover uma mudança cultural profunda na organização. Entre os principais benefícios estão:
Redução drástica de perdas e custos operacionais
Aumento da eficiência e da produtividade
Melhoria da segurança e da qualidade
Envolvimento de todos os níveis da empresa
Padronização de processos e maior previsibilidade
Reconhecimento internacional (no caso de multinacionais)
Conclusão
O WCM é hoje uma das metodologias mais completas e eficazes para empresas que buscam alto desempenho operacional e competitividade global. A partir de uma visão sistêmica, integrando ferramentas de excelência e pilares bem definidos, ele amplia a lógica do TPM e do Lean, abrangendo toda a cadeia de valor, inclusive logística e supply chain, como idealizado por Hajime Yamashina.
Mais do que uma ferramenta de produtividade, o WCM é um modelo de gestão empresarial para o século XXI, centrado na eficiência, na cultura de melhoria contínua e no protagonismo das pessoas.
Bibliografia
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YAMASHINA, Hajime. Challenge to world‐class manufacturing. International Journal of Quality & Reliability Management, v. 17, n. 2, p. 132–143, 2000. Disponível em: https://doi.org/10.1108/02656710010304546.